segunda-feira, 8 de março de 2010

Como reduzir o défice e a dívida pública portuguesa?

Portugal enfrenta uma situação económica preocupante com um défice de 9,3% e uma dívida pública de 91%. Para além disso, a economia e o emprego continuam estagnados, prevendo-se uma taxa de desemprego no final deste ano superior a 10%. Neste momento, o país discute uma estratégia de redução destes dois indicadores económicos através da elaboração do PEC para os próximos três anos. A UE exige nos seus estatutos que os vários Estados membros apresentem um PEC com um défice inferior a 3% e uma dívida pública abaixo dos 60%. Perante este cenário torna-se patente que Portugal terá um árduo caminho a percorrer. Assim sendo, torna-se importante apresentar e discutir as principais medidas que o Governo deveria adoptar.

O aumento de impostos é uma área incontornável e muito provavelmente será este um dos caminhos a ser seguido pelo Governo. Contudo, a realidade é que o povo português já não aguenta mais a subida de impostos, e a carga fiscal em Portugal é claramente superior aos seus restantes parceiros europeus. Em particular, a carga fiscal sobre as empresas é extremamente elevada e condiciona a sua competitividade. Assim sendo, impostos como o IRS e IRC não devem pelo menos aumentar. Aumentar o IVA poderá também não ser uma boa opção já que iria provocar uma menor confiança no mercado e, consequentemente, as receitas do IVA iriam diminuir. Assim sendo, sobram poucos impostos em que se pode mexer. Um deles seria o imposto sobre as mais valias em bolsa, que neste momento é bastante favorável para os investidores. Seria mais adequado que a taxa fiscal sobre o lucro das acções em bolsa estivesse uniformizada com os restantes parceiros europeus. Contudo, também não poderemos esquecer que esta medida apesar de ser socialmente correcta, irá sobretudo afectar o pequeno accionista que é tipicamente aquele que transacciona na bolsa portuguesa.

Outra medida que provavelmente pode ser incluída no PEC é o aumento da idade da reforma (e.g., passando dos actuais 65 para 67 anos). Contudo, uma medida neste sentido deve merecer a total reprovação. Em primeiro lugar, pois tal significa que os jovens terão mais dificuldades em encontrar um novo emprego, pois o sector privado, só por si, não consegue ser dinâmico o suficiente para gerar novos postos de trabalho. Em segundo lugar, a função pública tornar-se-á cada vez mais envelhecida e, consequentemente, pouco receptiva à inovação e à introdução de novas tecnologias e processos de trabalho que permitam tornar a nossa administração pública mais eficiente. Por último, o governo deveria caminhar no sentido da diminuição a idade da reforma e, desta forma, promover o emprego jovem. Um emprego que valorize as suas qualificações técnicas, que lhes dê condições para ter um nível de vida aceitável e que lhes permita encarar o futuro com optimismo.

Uma outra solução deveria passar pela revisão das carreiras na função pública. Em particular, o actual modelo de distribuição de prémios dos administradores públicos deve ser revisto. Não é admissível que em empresas públicas que dêem prejuízo, existam administradores que recebam prémios de desempenho. Muitos deles recebem estes prémios, pois a actual componente variável dos salários encontra-se baseada na sua hierarquia dentro da empresa, e não reflecte directamente o seu desempenho dentro da empresa, o lucro gerado pela empresa ou o crescimento da empresa nos mercados em que opera (nacionais ou internacionais). Para além disso, julgo que alguns dos níveis de remuneração das carreiras públicas deveriam ser revistas, nomeadamente os escalões mais elevados.

As grandes obras públicas anunciadas pelo governo deveriam ser revistas. Provavelmente, o projecto do TGV poderia ser suspenso já que a sua rentabilidade económica para Portugal é altamente duvidosa, apesar de não existir consenso neste ponto. Relativamente ao novo aeroporto de Alcochete terá que se optar pela sua construção faseada por módulos, de forma a diminuir o investimento inicial necessário e para atender aos novos padrões de procura no transporte aéreo que sofreu uma redução significativa face ao actual período de recessão económica que se vive a nível mundial. Também não se entende muito bem a aposta do governo na atribuição de novas concessões de auto-estradas no litoral de Portugal, que já se encontra bem servido deste tipo de vias. Seria preferível optar-se pelo melhoramento das estradas dentro das autarquias e na construção de novos e melhores ramais de acesso às auto-estradas. Os investimentos públicos são necessários neste actual clima de recessão económica com vista à dinamização da economia e na geração de novos empregos, mas é preciso ser criterioso na escolha dessas áreas. Seria mais adequado proceder-se a investimentos na área do transporte ferroviário de mercadorias, na área do turismo e na área de desenvolvimento dos nossos portos, tornando-os na via de entrada na Europa para as mercadorias oriundas da América e África.

Por último, combater o défice e a dívida pública portuguesa vai exigir um efectivo combate da economia paralela. Este combate passa por uma maior fiscalização do Governo, mas também passa por uma mudança de comportamentos de cada um de nós. Temos que ser socialmente mais responsáveis e exigir a respectiva factura pelos serviços que nos prestam. Para além disso, temos que possuir uma política de combate ao nosso actual défice externo em termos de balança comercial. Continuamos ainda a ser um país excessivamente dependente da energia do petróleo e do gás, que são um dos principais responsáveis pela nossa balança comercial negativa. A aposta nas energias alternativas é a solução para este problema e no qual o governo tem feito um esforço significativo. Há que caminhar cada vez mais neste sentido e aumentar a dimensão destes projectos. Por fim, o Estado tem que conduzir uma política de privatizações e diminuir o seu peso na sociedade portuguesa. Contudo, chamo a atenção que esta política de privatizações deve ser cuidadosa e deve obedecer a critérios de transparência. Seria desejável que existisse uma avaliação prévia dos sectores de actividades que podem passar exclusivamente para controlo dos privados, e outros sectores que devem permanecer sobre o controlo do Estado, devido à sua importância estratégica e à sua inclusão na lista de bens e serviços de necessidade básica para os portugueses. Uma clarificação das áreas de actividade que devem ser privatizadas deveria merecer o consenso no parlamento e deveria ser alvo de um trabalho político sério e responsável para os próximos meses.